terça-feira, 18 de novembro de 2014

Ética no jornalismo: analisando o Blog do Geraldo José

Texto: Bruno Rosa, Gislane Oliveira,
Ilana Santos, Neucimeire Souza,
Patrícia Barbosa, Tarcilla Félix.

Por volta do século XIX, época do surgimento das normas e leis no jornalismo, a preocupação dos profissionais que atuavam no campo da comunicação era grande com as questões de ética. A Carta dos jornalistas franceses, a Declaração de Munique e os códigos elaborados por diversos países da Europa são exemplos de como era fundamental o cuidado com o que se podia ou não publicar por parte dos jornalistas. O escritor Daniel Cornu (1998) corrobora com isso quando cita o censo realizado em 1995 o qual mostrava que: jornalistas de vinte e nove países da Europa dispunham de um código deontológico sobre a profissão, oito novos códigos foram elaborados entre os anos 70 e 80 e quase todos esses textos passaram por revisão até os anos 90. “Essa proliferação deontológica manifesta o interesse da mídia pelas questões de ética normativa”, salienta o autor em seu livro Ética e informação.
Desse período até os anos 2000, século XXI, tempo da expansão da informação e das comunicações em massa, pode-se dizer que a pressa, o deslize ou a omissão tem feito com que a ética jornalística decaia, trazendo notícias e reportagens mal elaboradas, tornando-se muitas vezes uma ofensa aos direitos humanos.

Editoria de polícia
No dia 30 de Outubro, às 21:27 h, a editoria policial do Blog do Geraldo José publicou uma matéria com o seguinte título “Dois elementos numa moto matam mais um no Bairro Codevasf, em Juazeiro”. A notícia traz antes do texto três fotos montadas. Na primeira a vítima está viva, com boa aparência, se assemelha a uma foto de perfil nas redes sociais. Ao lado desta, outra imagem mostra o mesmo homem, mas agora, morto depois de sofrer o ataque dos bandidos. Sem nenhuma proteção, o rosto ensanguentado, os olhos meio abertos e a aparência debilitada da vítima é exposta ainda dentro do carro onde os tiros foram efetuados. Parece que o repórter chegou logo após o  crime e fez as fotos em primeira instância. A terceira foto da montagem expõe, num plano mais aberto, o homem deitado de bruços no interior do carro. No lado esquerdo dessa imagem percebem-se umas manchas desfocadas que tentam esconder o rosto de um provável curioso que por ali passava.
O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, elaborado em 2007, deixa claro que: 


Art. 7º O jornalista não pode:
IV - expor pessoas ameaçadas, exploradas ou sob risco de vida, sendo vedada a sua identificação, mesmo que parcial, pela voz, traços físicos, indicação de locais de trabalho ou residência, ou quaisquer outros sinais;
Art. 11. O jornalista não pode divulgar informações:
II - de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e acidentes;

Sem estar atenta ao que diz a lei em vigência, a equipe do blog não preservou a identificação da vítima depois de morta e machucada, violando ainda a Declaração Universal dos Direitos Humanos que garante, no artigo 12º, o direito do homem de não sofrer intromissões arbitrárias em sua vida privada.

Voltando para o texto, é possível analisar a construção de um lead seguido de algumas informações complementares. Em certo momento, aparece a seguinte afirmação “o fato despertou a atenção de vários populares que informaram à reportagem que a vítima já tinha passagens pela delegacia de polícia”. Que populares foram esses? Quais seus nomes? Eles não quiseram expor sua identidade? A notícia não explica nenhuma dessas perguntas. Além disso, uma acusação desse nível precisa de provas, principalmente por se tratar de um homem já morto, que terá a sua reputação bastante prejudicada. Porém, é sabido que a Constituição brasileira de 1988, no Capítulo I Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, Artigo 5º, inciso XIV, resguarda o sigilo da fonte quando necessário ao exercício do jornalista, bem como, assegura a todos o acesso da informação.
Não haveria problema se a redação explicasse o desejo da fonte em manter-se oculta, ou então, apontasse quem foi o autor da informação, de grande relevância por sinal, para que os leitores tivessem mais condições de avaliar e compreender o  acontecimento. O uso de fontes enriquece o texto e traz confiabilidade, confirmamos isso no Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros 

                          Art. 12. O jornalista deve:
I - ressalvadas as especificidades da assessoria de imprensa, ouvir sempre, antes da divulgação dos fatos, o maior número de pessoas e instituições envolvidas em uma cobertura jornalística, principalmente aquelas que são objeto de acusações não suficientemente demonstradas ou verificadas;
II - buscar provas que fundamentem as informações de interesse público;

Por fim, o texto e as imagens não receberam, na matéria, nenhuma autoria (créditos). O texto está sem assinatura e as fotos estão sem legendas e sem assinatura. É lamentável encontrar no jornalismo de hoje publicações dessa forma. O reconhecimento da autoria de uma obra é um dever da empresa, um direito do jornalista e uma responsabilidade para com o receptor que precisa conhecer quem buscou e fomentou tal fato. O Código de ética dos jornalistas do Brasil, no capítulo 6º, inciso IX deixa claro que deve-se respeitar o direito autoral. Além disso, a Constituição brasileira garante:

XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;
XXVIII - são assegurados, nos termos da lei:
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;
b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas;       

Orientação à população

À população em geral deixamos uma orientação. Àqueles que, porventura, se sentirem ofendidos com os serviços de comunicação no Brasil estarão acolhidos pela Constituição Brasileira que no Artigo 5 º escreve:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...)   
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Modelo colinial - escravista
         O jornalista Bernardo Kucinski em seu livro a Síndrome da Antena Parabólica (1998), lembra que por causa do modelo colonial-escravista que perdurou no Brasil por 400 anos, as pessoas ainda se colocam em uma posição de subserviência, omissão, medo, ausência de autoestima o que impossibilita a construção de uma sociedade e de uma mídia mais democrática. Até mesmo muitos jornalistas se colocam nesse princípio de exclusão, denominado por Kucinski. Contudo, pela manifestação de algumas pessoas que não fazem parte desse grupo de “intimidados” o jornalista cita algumas conquistas, entre elas estão a regulamentação para as rádios comunitárias e a alocação de quatro canais para uso comunitário em todas as concessões de TV a cabo.
Poucas ou não, essas vitórias são significantes e mostram o resultado da ação de um povo que age em conjunto para alcançar o respeito, a garantia dos direitos e o cumprimento da lei, algo que todos nós podemos fazer.    

    
Referências:

BLOG GERALDO JOSÉ. Dois elementos numa moto matam mais um no Bairro Codevasf em Juazeiro. Disponível em: http://www.geraldojose.com.br/index.php?sessao=noticia&cod_noticia=56730. Acesso em 31 de Outubro de 2014.
CORNU, Daniel. Ética da Informação. Bauru, SP: EDUSC, 1998. 

KUCINSKI, Bernado. A síndrome da antena parabólica. São Paulo,SP: Fundação Perseu Abramo, 1998. 


   

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